Na década de 1950, Maria era a oitava de uma família humilde de 10 filhos. Desde que se entendia por gente, ela sonhava em ser professora, mas ela só teve acesso à educação básica, pois não havia escolas onde morava. Com pouco mais de 20 anos, ela finalmente foi com a família para uma cidade maior e, mesmo trabalhando de dia, conseguiu concluir o magistério em uma das escolas para adultos à noite e então, finalmente realizou seu sonho de ensinar. Nos anos 80, Maria já tinha um diploma de licenciatura em História e, em 1988, adotou uma menininha: Euzinha.

Olha crianças! Assim eram os primeiros celulares.

Minha mãe me criou sozinha e sempre foi meu modelo de independência e autonomia. Cresci nos anos 90/2000 e vi o trem da tecnologia se tornar acessível. Entrei nele e me sentei confortavelmente enquanto ele saia da estação. Minha mãe, porém, não. Enquanto eu estava no computador, ela estava corrigindo provas manualmente, sacando seu dinheiro todo mês no banco (chegando cedo e enfrentando uma fila enorme). Não havia muitos computadores na escola onde ela trabalhava e não cabia a ela manuseá-los. Celular era para gente rica, televisão ainda era de tubo com poucos canais. Havia um microsystem na nossa casa, mas ela só ouvia de vez em quando. Pra que ela ia se preocupar com aparelhos tecnológicos e telas se o mundo não exigia isso dela?

Então, ela se aposentou, aprendeu a usar o caixa eletrônico, mas preferia ir ao caixa comum para pedir ao funcionário que lhe pagasse seu salário. O primeiro celular se tornou necessário, pois eu estava indo estudar à noite na faculdade; era importante manter o contato e a conta do telefone fixo ficaria muito alta. O primeiro smartphone foi uma exigência para ela se comunicar com as amigas e família no WhatsApp, mas foi aí que a briga com a tecnologia começou.

Minha mãe, que sempre foi um modelo de autonomia, professora há mais de 30 anos, primeira mulher graduada da família, se achava burra, porque não entendia aquele negócio. E aos poucos ela se tornou cada vez mais dependente de mim, porque no mundo que ela vivia agora tudo era smart, tudo era tela, tudo era digital. Pra mim isso aconteceu aos poucos, pra ela foi do dia pra noite.

Você conhece essa história? Eu sei que isso não aconteceu só com minha mãe. Minha prima também foi obrigada a aprender a dar aulas pelo computador e pelo celular durante a pandemia, porque até então as escolas pouco se importavam em digitalizar e treinar adequadamente o corpo docente. E não é só a pública? Digo isso porque eu cheguei a ensinar em uma escola particular em 2014 e o ensino de informática (que, pelo amor de Deus, esse termo se usa desde que eu estava na 5ª série) entrava na mesma caixinha de arte e religião. A caixinha de “tá no currículo, né? Pega o professor de inglês e taca aí uma horinha de aula pra isso”. Eram 2 ou 3 alunos em um computador ou notebook jurássico para pesquisar alguma bobagem no Google ou jogar algum “game educativo”. Eu não tenho ideia de como estão as escolas agora, acredito que já deve ter mudado. Meu ponto é, você entende que a revolução tecnológica veio como uma bigorna na cabeça de muitas pessoas que cresceram em um mundo mais analógico?

Aqui entra minha visão de UX designer

Enquanto estava fazendo a transição de designer gráfico para UX o que mais ouvi é que devemos colocar o usuário no centro das decisões. Que devemos levar em conta a inclusão, devemos ter empatia e inserir soluções de acessibilidade. Ótimo, concordo com tudo isso. Entendo que todo projeto tem um público alvo e que o uso de personas pode ajudar a desenvolver empatia. Mas e os usuários que mal conhecem a linguagem de ícone? Quando a pessoa não sabe diferenciar links em um texto corrido? Ou os botões de ação que ele conhece no aparelho geralmente são na parte inferior da tela, e de repente uma aplicativo coloca na superior? Ou não conhecem a diferença entre um link confiável e outro que pode levar a um virus?

A sensação que tenho é que há uma geração que foi esquecida nos testes de usabilidade ou nas pesquisas de usuário. Quando se fala de acessibilidade os tópicos mais famosos (e igualmente importantes) são majoritariamente relacionado as sentidos e mobilidade, mas e a cognição? E o histórico analógico de um mundo que praticamente está em extinção desde os anos 2000?

Sou a favor que esse mundo volte? Lógico que não! Sou aquariana meu bem, minha mente vive no futuro. Um futuro que pode incluir nossa geração perdendo a autonomia também. Isso porque…

imagem: Google Next Billion Users

Estamos vivendo uma nova revolução tecnológica.

Aquela que inclui a popularização da inteligência artificial, que já está acontecendo há um bom tempo. O fato do seu celular reconhecer sua digital, já é a Ai a todo vapor. Só que agora ela tem nome: Alexa, Siri, ChatGPT. E tentando fazer a vidente, prevejo alguns caminhos:

  1. Entramos em pânico porque empregos serão substituídos pela Ai. Lembra da Revolução industrial em que o homem era substituído pelas máquinas? Pois é, e quem se manteve no mercado? Quem teve a oportunidade de se adaptar. Aliás assim foi a história da humanidade. Precisamos sempre nos adaptar pra sobreviver. Então um outro caminho, obviamente é…
  2. Se adaptar as mudanças da industria tecnológica. Mas quero destacar aqui “Quem tem a oportunidade”. Significa que algumas pessoas, assim como minha mãe, estão fazendo outras coisas pra pagar suas contas e essas coisas podem não incluir Ai imediatamente, e quando a bigorna cair, pode ser tarde demais. E é para elas que devemos trabalhar também. Está na mão de quem trabalha com experiência de usuário incluí-las nas pesquisas de UX e personas. Mas não pense que nós que trabalhamos na indústria estaremos muito bem obrigado…
  3. Assim como nossos pais estamos aqui tentando pagar nossos boletos em dia, enquanto isso novas linguagens surgem, novas soluções tecnológicas estão chegando todos os dias na velocidade da luz. Eu sempre me pergunto o que vai fazer com que eu me sinta burra diante de um avanço tecnológico daqui ha uns anos? Enquanto para os jovens ao meu redor, vai ser óbvio. Metaverso, Criptomoeda, NFTs você está atualizado desses assuntos? Se sim, parabéns, porque nem todo mundo está. Se não, vamos tomar um café um dia desses? Porque pra falar a verdade, nem eu.

Aqui entra a Assistente Virtual

Conversando com um cliente sobre isso, ele fala: “Mas vai ter assistentes virtuais que vão fazer isso tudo pra gente”. Concordo! E talvez seja esse o caminho pra nossa autonomia não ficar pra traz. Ou mais ou menos isso, porque vem o ponto da conversa que de o quanto vamos entregar nossas vidas para as empresas de Ai, mas isso é assunto pra outro dia. Por enquanto acredito que é o futuro da familia de assistentes virtuais e o algoritmo do ChatGPT é quem pode minimizar nosso impacto com os avanços do futuro. Eu já imagino a Alexa ou a Siri conversando comigo igual o ChatGPT. Porque para o público que está muito ocupado vivendo a vida de adulto e pagando contas, o stress do dia a dia é suficiente pra inserir Metaverso na conversa.

Espero que essa transição seja mais leve com assistentes inteligentes. Espero menos respostas como “Não sei nada sobre isso”. Que fontes sejam citadas, lógico! Mas que “foi isso que encontrei sobre Blablabla”, quase de um te vira aí pra ver se é a resposta implícito seja menos comum.

Espero que o avanço das tecnologias, como a inteligência artificial, nos permita acessar as informações de maneira mais intuitiva e simples, evitando assim que algumas pessoas fiquem para trás. As assistentes virtuais podem ajudar a minimizar esse impacto, fornecendo informações mais precisas e acessíveis. Além disso, elas também podem ajudar na redução do estresse e da ansiedade das pessoas, já que não precisamos nos preocupar em procurar informações ou realizar tarefas complexas.

Espero também que as mentes não fiquem tão preguiçosas, porque esse parágrafo a cima mesmo, foi a Ai do Notion que escreveu. As escolas e universidades vão precisar se adaptar, os criadores de conteúdo também.

O que me faz pensar que em um mundo mais próximo do filme Her, como serão nossas relações com as pessoas? Haverá mais comunicação chocha criada por Ai, ou vamos valorizar mais o conteúdo escrito por pessoas? O que vai ser confiável? Porque nem tudo que vamos ler, ouvir e ver será feito por seres humanos como estamos acostumados.

Por falar desse filme, já existe como ter uma relacionamento com Ai viu?! O aplicativo se chama Replika e já está indo para o Metaverso.

Pois é amiga, nosso mundo está se transformando, é hora de trocar de trem e se adaptar. Ou orar para as assistentes virtuais serem uma ponte confiável entre humanos e tecnologia num futuro que já está logo ali, dobrando a esquina.

E colegas UX designers, vamos tentar convencer nossos clientes que os projetos precisam se adaptar as necessidades das pessoas, com diferentes cognições e vivencias, não enfiar goela a baixo a solução revolucionária que a empresa está propondo. Parece obvio, porque é o que mais tentamos fazer, mas as pessoas como minha mãe e as amigas, assim como outros pais e amigos, tias, tios e alguns primos e primas ainda estão pedido para seus netos, filhos e sobrinhos para ajeitar as coisas no celular, procurar aí no computador algo pra eles, ou mexer no aplicativo do banco. Ou seja, essas pessoas estão vivendo uma péssima experiência de usuário.

Conclusão

A tecnologia veio para nos ajudar a viver melhor, mas ela também precisa se adaptar às necessidades das pessoas. É importante lembrar que nem todos estão no mesmo nível de conhecimento tecnológico e que nem todos têm oportunidades para se adaptar às mudanças. Por isso, é importante que os desenvolvedores e designers de produtos se preocupem em criar soluções que sejam inclusivas e acessíveis a todos os usuários, mesmo aqueles que não possuem conhecimento técnico. A inteligência artificial pode ajudar a melhorar a experiência de uso de produtos tecnológicos, fornecendo informações mais precisas e acessíveis. Assim, as pessoas terão mais autonomia para usar a tecnologia e não ficarão para trás.

ps.: Esse não é um conteúdo alarmista, tá bem? É uma analise pessoal de uma realidade que talvez tenha sido esquecida.

Posted by:annapgaud

One thought on “Porque acredito que a inteligência artificial pode melhorar a experiência do usuário

  1. Amei escultor novamente a história de tia , e concordo completamente com essa tecnologia que véio para nos ajudar e também lar atrapalhar se não souber manusear ,confundir muita gente.

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